( Capítulo I / Capítulo II / Capítulo III / Capítulo IV/ Capítulo VI)
Dessa vez com o cachorro certo na cama!
OO único problema do meu pai estar em casa era o simples fato da minha mãe esquecer da minha existência. Ela sabia exatamente o quanto eu odiava acordar atrasada, mas esquecia toda vez que estava “ocupada demais” sendo feliz. Parece egoísmo, mas a ideia de crescer e ser independente me assustava muito. Em dias mais tristes, eu costumava me trancar no banheiro – o único lugar seguro e com chave da casa – só pra chorar encostada na porta sem que ninguém percebesse. Eu odiava parecer fraca. Odiava ouvir o meu irmão dizer que todos os meus problemas eram resolvidos com choro – quem dera.
Eu era do tipo de garota ‘durona’ que acumulava meses de angústia, para depois desabar por algum motivo idiota, quase sempre implicância feita pelo resultado de um bendito sexo sem prevenção da minha mãe – meu irmão. De alguma forma, meu humor estava sempre diretamente ligado com minha vontade de chorar. Eu começava a chorar por raiva, mas quase sempre terminava por amor.
Abri meus olhos naquela manhã sem acreditar que o final de semana já havia acabado, eu odiava as segundas e todas suas melancolias. Do meu quarto eu conseguia ouvir vozes da cozinha, mas não foi isso que me fez levantar. Eu já quase adormecia novamente, quando recebi uma lambida gelada e nojenta na minha mão direita que caia para fora da cama.
– Olá amiguinha! – Sorri enquanto pegava a cadelinha ainda sem nome no colo. Pelo menos alguém naquela casa me dava bom dia.
Meus pais estavam terminando de tomar o café quando surgi na cozinha com um sorriso de que-bom-que-vocês-lembram-de-mim!
– Já escolheu o nome dela? Disse meu pai sorrindo, provavelmente para quebrar o silêncio.
– Ainda não… Tem alguma sugestão? Perguntei para o meu pai, mas com a certeza que o meu irmão responderia.
– Sazuki. – Gritou o meu irmão confirmando minha tese.
– Ela não é um desses seus desenhos animados idiotas. Shiu!
– Filha! – Meus pais disseram em coral quando escutaram minha frase. Eles não queriam que eu fosse legal com ele aquela hora da manhã, queriam?
Fui para o meu quarto com um copo de leite e uma torrada na boca. Hora de desarrumar meu guarda-roupas, quer dizer, escolher uma roupa para ir a escola. Eu nunca tive o corpo perfeito, mas a maioria das roupas caíam bem em mim. Embora meus pais sempre falassem que puxei o porte do meu avô, eu nunca me considerei uma garota alta. A maioria das meninas da minha turma mediam quase um palmo a mais do eu. Mas, se meus pais queriam me chamar de alta, quem era eu pra impedir?
Minha cama já estava quase soterrada quando vi no fundo da gaveta uma de minhas blusas prediletas. Eu adorava estampas principalmente quando elas tinham alguma frase em inglês. Qual a frase daquela blusa? I Don’t Love You Anymore. Não que eu quisesse que o Phelipe visse. Não que fosse uma indireta. Era aquela, apenas aquela.
Eu não costumava abusar da maquiagem, mas não saía de casa sem um delineador. Isso meio que era minha marca registrada, ninguém da sala sabia passar como eu, era legal ser a única. – Isso até eu ensinar para a Alícia e ela usar diariamente e todo mundo reparar. Claro.
Quando me vi pronta no reflexo do espelho percebi que aquela Danie com olhar triste estava indo embora e deixando eu seu lugar a velha Danie de sempre. A Danie que amava ser observada.
Bolsa. Chave. Dinheiro. Celular. Livros.
– Tchau família feliz! – Disse enquanto descia as escadas sem olhar pra baixo. Eu adorava pensar que sabia de cor a distância de cada degrau. Louca eu?
Mesmo sem ter absolutamente nada aparentemente diferente das outras meninas da minha idade, as pessoas – em especial as crianças – daquela pequena cidade onde nasci pareciam não conseguir tirar os olhos de mim. Eu egocêntrica como era, amava isso.
Meus passos de casa até a escola sempre seguiam os compassos da música do meu fone de ouvido. Eu tinha uma paixão por lentas, então a pequena distância da minha casa até o colégio se transformava em trinta minutos de muitos pensamentos e olhares – ou desvios.
Tudo ficaria bem se naquela manhã, do outro lado da rua não estivesse minha melhor-amiga–piranha. Ela era linda e sabia exatamente como usar a beleza ao seu favor. Andava suavemente, mas ainda sim parecia uma daquelas magrelas modelos de passarela. Eu odiava isso. Nós nos conhecemos no jardim de infância, naquela época eu era extremamente tímida e ela era exatamente o contrário. Dupla perfeita? Até começar a competição. Ela amava tudo que eu amava primeiro, e eu não estou falando só do meu namorado. Eu a via como um reflexo – melhorado – meu. Seu cabelo sempre foi mais liso, mais cumprido, mais sedoso que o meu. Porque o meu corte caía tão melhor nela?
Continua.