Não sei bem se tem a ver com o meu lado autora, mas tenho fascínio por desconhecidos. Quando viajo de ônibus, por exemplo, gosto de ficar imaginando a vida das pessoas que passam em segundos por mim. Arrumo briga mas fico sempre na janela, observando de longe o comportamento de cada uma delas. Ruas de pedras amareladas e cidades com pequenas praças vazias. Senhoras na janela vendo a vida passar. Crianças na calçada sorrindo e gritando. Homens bebendo em um bar e atentos a TV, é gol?
É tudo tão igual, e ao mesmo tempo, tão particular. Cada expressão. Cada esquina. Sinto que por instantes, poderia decifrar olhares e criar novos destinos. Será que tudo isso é efeito do Dramin?
Certa vez vi uma menina sentada na escada de uma casa azul simples que ficava em uma pequena cidade, provavelmente ainda menor que a minha e de nome desconhecido. Seu olhar parecia distante. Quando a vi, senti na hora um aperto no peito. Como se algo nela doesse dentro de mim. Percebi em seu olhar que ia em direção ao ônibus, uma vontade de não estar naquele lugar. Prisão sem grande, estradas.
Talvez ela quisesse subir naquele ônibus e seguir caminho junto comigo em busca dos seus sonhos. Ou sei lá, que uma pessoa especial sentada na poltrona ao lado pedisse pro motorista parar a qualquer custo, e descesse só pra dizer três palavras bestas que mudariam tudo. Enquanto imaginava tudo isso, senti pena. Pobre garota.
Algumas quilômetros depois, vendo as enormes montanhas típicas da região onde moro, e me sentindo como sempre um pequeno grão de areia no mundo, já bem longe daquela pequena cidade, percebi o quanto estava errada ao sentir pena e imaginar tantas coisas da menina. O planeta é tão grande, as pessoas podem querer tanta coisa para suas próprias vidas. É egoísmo demais imaginar que todo mundo sente e pensa da mesma maneira que eu. Talvez eu faça isso na vida real, no universo além de desconhecidos em viagens de ônibus.
Acho que as vezes é difícil entender que cada pessoa tem um propósito de vida diferente. Por mais que a gente imagine, suponha e torça, não podemos decifrar o que o outro realmente quer. Muito menos, ditar. É isso que dói, mas é essa a graça. Acredito que se soubéssemos tudo que se passa no coração de quem a gente ama, deixaríamos de amá-lo no mesmo instante. A graça é ir descobrindo pouco a pouco, da janela do ônibus, abraçados na cama ou estudando pra prova impossível de matemática. Aceitar as diferenças. Amá-las.
Então, Por favor, senhorita expectativa não espere que as pessoas sejam como nos filmes ou novelas. A vida real não tem roteiro. Não somos divididos por mocinhos, vilões e figurantes. Existem vários personagens dentro de nós. A gente é que ao acordar, escolhe qual vai ser.