Parece que foi outro dia que abri a porta desse quarto pela primeira vez. Paredes brancas, janelas fechadas e alguns objetos no chão provavelmente esquecidos pelo antigo morador. Foi o primeiro e único apartamento que olhamos. A primeira vez que chamei um outro lugar de casa.
Na primeira semana, antes mudar de vez, enquanto ainda estava em São Paulo resolvendo detalhes do aluguel e comprando os móveis, tudo parecia novo e incrível. A parte mais difícil veio quando peguei o ônibus sozinha de Leopoldina pra cá pela primeira vez. Foi logo depois do Carnaval. Era só eu, meus sonhos e as malas enormes. Dei sorte. A poltrona ao lado estava livre. Não tive que segurar as lágrimas na hora da tradicional despedida pela janela do ônibus.
Cheguei em São Paulo assustada. A primeira semana talvez tenha sido a mais difícil de todas. Mesmo conhecendo muita gente através internet, era complicado estar sempre rodeada de pessoas que eu ainda não confiava de verdade. Odeio ter que conversar moderando absolutamente tudo que vou dizer. Hoje acredito que a solidão tem muito a ver com isso. Não depende de estar com uma multidão sorrindo ou trancada em um quarto escuro chorando. É questão de ter – por perto ou não – alguém pra contar aquelas coisas que não deveríamos contar pra ninguém.
Bem, depois de uma ou duas semanas descobri que eu já tinha essa tal pessoa: minha mãe. Pois é, é bizarro admitir mas a distância fez com que nos tornássemos ainda mais próximas. E finalmente, o fato de até então não ter muitos “melhores amigos” fez algum sentido (é melhor e mais fácil quando a gente consegue enxergar o lado bom das coisas).
O tempo foi passando. No meio da bagunça do meu quarto e da minha caixa de entrada lotada, fui descobrindo um mundo, digamos… diferente. Cheio de armadilhas, surpresas e principalmente, desafios. Sabe aquela coisa que dizem por aí sobre enfrentar por dia pelo menos uma coisa que te faça sentir medo ou frio na barriga? Acontecia sempre: Aquela reunião importante, a primeira cena de beijo na aula de teatro, um primeiro encontro com alguém especial, a primeira viagem de avião sozinha, uma palestra em uma escola pra mais de 400 alunos ou sei lá, as consequências do primeiro porre em uma festa.
Coisas como essas fazem com que eu me sinta cada vez mais uma garota absolutamente normal. Histórias que ficaram registradas e o melhor, que foram compartilhadas com pessoas que se tornaram ou estão se tornando importantes.
Acho que se a gente for parar pra pensar, os nossos erros e acertos acabam sendo uma espécie de bússola interna que carregamos pra lá e pra cá. Eles mostram a direção, mas a escolha será, independente de qualquer outra coisa, nossa. Ainda precisamos viver pra saber, e pra viver, escolher. Depois é sempre tarde.