“E quando eu digo louca, é louca mesmo! Eu sonho com você e, por alguma razão doida, é como se eu já te conhecesse. Tão, tão bem. As dobrinhas no canto dos olhos quando você ri, a paixão por sorvete de pistache, a implicância boba com sua irmã mais nova… Podem dizer o quanto quiserem que você não existe. Mal sabem eles!
Sonho com você já faz alguns anos. Nunca estamos viajando pelas praias do Caribe ou jantando em um restaurante caro. Quando você surge na minha cabeça, está enrolando o brigadeiro que eu acabei de fazer, achando algum filme pra gente assistir na TV ou cantarolando bem alto aquele rap esquisito do Eminem que você tanto ama.
Olha, pode ser carência, sim. Afinal, estou quase me formando no colégio e sou a única (de novo: a única) solteira da turma. Não que ser solteira seja o fim do mundo, mas, como dizem alguns amigos, não pego nem resfriado. Haha. Nas festas, é como se os caras me achassem invisível. E eu nem me considero feia nem nada. Sei lá, acho que fico tão tensa que me fecho e não atraio olhar nenhum (ou, pelo menos, não vejo ninguém olhando pra mim).
É por isso que acabo sonhando com você, é a minha forma de viver um romance de cinema. Ah, como eu quero viver um romance de cinema! Não sou inocente, sei que nenhum namoro é só flores, mas, nossa… Até as brigas que teremos me deixam ansiosa. Eu quero viver um amor. Quero passar por isso. Sentir os arrepios e as tais borboletas. Quero tanto…
Ó, eu sei ser feliz sozinha, viu? Não vivo sofrendo por aí ou te esperando na janela. É só na hora de dormir, mesmo, que você chega, lindo e feliz, com seus óculos de grau quadrados e suas covinhas, pegando na minha mão e me puxando pra fila da pipoca. ‘O filme vai começar, doidinha! Tá aí parada pensando em quê?’
Teremos nossas músicas, nossas piadas, nossas aventuras e nossa cumplicidade. Tô louca pra te ver chegar.”
—
Estou sentada na mesa da cozinha e termino de ler a carta que escrevi quando era adolescente. Encontrei-a mexendo em caixas antigas enquanto ele cozinhava um belíssimo e refinado miojo pra gente. Sete anos depois, ele está aqui.
“Ei… Tudo certo aí?”, pergunto.
“Tudo! Espero que você esteja pronta pra um jantar dos deuses. Magnífico! Miojo com guaraná!”, ele responde, sorrindo e me olhando de canto de olho.
“Você sabia que, quando eu era adolescente, suspirava horrores por um namorado dos sonhos? Todo perfeito e idealizado?”
“Hahaha. Não! Bom, um namorado você encontrou. E aí, eu me pareço com esse cara dos sonhos?”, ele diz, enquanto larga a panela, coloca os óculos e me encara.
“Bastante. Só faltou uma coisa.”
“Em mim? O quê?”, ele pergunta.
“Nele.”
Dois sorrisos.
“Ele não era você.”