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Na última vez que te vi nós nem nos olhamos direito. Qualquer pessoa naquela festa diria que éramos completos desconhecidos se cumprimentando, mas a sensação de que ninguém nesse mundo me conhece tanto quanto você ainda me sufocava. É uma droga ter tanta memória em comum com um estranho. É como se parte das melhores lembranças que tenho não passassem de pura imaginação. Ninguém acredita no quanto nós funcionávamos juntos. Nunca fomos iguais aos outros casais. Não precisávamos provar nada a ninguém.

As pelúcias eu joguei fora, mas ainda coleciono as coisas que você me disse. Se eu organizar direitinho numa folha de papel vira um lindo poema sem rima. O amor morreu antes da última estrofe e suas promessas tinham prazo de validade.

Nove de dezembro de dois mil e seis.

Eu quis voltar no tempo pelo menos um milhão de vezes. Mudar o que eu disse, mudar o que eu fiz, te abraçar um pouco mais forte, sentir o gosto da sua boca pela última vez, roubar aquela sua camiseta legal que eu sempre vestia pra dormir ou te dar um soco bem dado na boca do estômago. Depois me veio a cabeça que eu conseguiria te conquistar de novo, mas a verdade é que a garota que eu me tornei não combina mais com você.

Agora eu gosto de sair. Gosto de juntar grana e viajar sozinha para lugares que eu nunca fui. Aprendi a cozinhar assistindo vídeos na internet, acompanhei todos os capítulos da última novela ao lado da minha mãe e fiz uma tatuagem enorme nas costas. Escuto MPB pra me acalmar quando o dia tá uma merda e aprendi a dirigir. Adotei um cachorrinho de rua que me acompanhou até a padaria e cortei o cabelo no ombro. Agora eu danço até o dia amanhecer e não tenho mais vergonha de desabafar com os meus amigos.

Existe uma nova versão de mim que você não ajudou a construir. Sou mais forte porque depois de muito quebrar a cara entendi que solidão não tem a ver com estar sozinha no mundo, mas sim achar que a única companhia que vale a pena é a de alguém que não se importa.