você está lendo Entre o rosa e o azul
sexista

Foto: Brixton/Reprodução

– Mãe, por que o álbum de fotos do meu nascimento é azul? – Foi o que eu perguntei a ela.

– Porque sim.

Ué. Porque sim não é resposta! Tinha que ter um motivo muito grande para que esse acontecimento sério tivesse acontecido. O álbum da minha irmã era rosa – já o meu, azul, mas azulzinho mesmo, da cor do céu e da água da piscina limpinha da casa da minha tia. Sem nem uma florzinha ou um laço pra contar história, nenhum sinal de fofura qualquer. Talvez ela até tenha ido comprar um igual ao da outra filha, mas, cinco anos depois, as versões cor-de-rosa do mesmo modelo se esgotaram. Um baby boom de meninas em 1993 poderia ter ocasionado isso, é… faz sentido! Ou, talvez, ela estivesse contando com o nascimento de um garoto, quando, oh!, mais uma menininha estava vindo por aí. Em último caso (vai saber?), um parente desavisado pode ter dado este presente. Um terrível engano de sua parte.

Engano? Mas que engano?

Quanta besteira. Este negócio de azul para meninos e rosa para meninas está com nada. Eu sei, a gente viu essa separação acontecendo durante toda a nossa vida, desde a escolha das nossas roupinhas e acessórios de bebê – bom, fora o meu álbum de fotos, como você percebeu – até o dia de hoje. Sim, porque este paradigma ainda é muito forte.

Pense comigo: como pode uma cor definir quem você é – ou “deve ser”? Faz sentido algo tão genérico ter algum tipo de poder sobre a sua identidade e sexualidade? Não. As coisas são muito mais complexas, mas parte da sociedade insiste em tentar fazer com que a gente siga este conceito – e não é por nada não, mas acho que não rola mais, hein? Eu mesma, quando pequena, pensava dessa forma, como você viu no diálogo e nos questionamentos que abrem este post. Foi aos poucos que consegui entender que não há lógica na cultura sexista.

Entendamos: um gênero não é diferente do outro e muito menos superior ao outro. Todos nós somos seres humanos e temos garantida a liberdade de fazer as nossas próprias escolhas (certo, às vezes, na prática, não tanto quanto gostaríamos). Gostarmos da cor que bem entendermos. Vestirmos o que quisermos, como quisermos e da forma que escolhermos. Todos nós.

Você está acompanhando as marcas de moda que vêm abraçando a causa e criando coleções sem gênero? É legal, né? Inspirador, um passo importante. E isso acaba dando mais pano pra manga para o assunto. Se um cara quiser usar um vestido, uma blusa de florzinhas ou frases fofinhas, sim, ele tem que poder fazer isso. É claro que ele pode usar uma roupa “destinada” a mulheres, mas não seria melhor se houvesse, sempre, números e tamanhos próprios para ele também? É só fazer as mesmas roupas em diferentes modelagens, não é? Sem separar, sem dizer: “Olha, esse é pra você e esse é pra você”. Estamos em 2016, sabe? É tão, tão lindo que as possibilidades de escolha estejam aumentando. As pessoas merecem isso!

Falando assim parece fácil, lindo e acessível. A gente sabe. Mas isto aqui é só um texto e, na vida real, as coisas são bem mais duras e difíceis. Fora da tela do computador, ainda existe um preconceito gigante com as escolhas individuais de cada um – e principalmente nós, mulheres, somos as que mais sofremos com as desigualdades de gênero. Disso você já sabe.

Mas fica aqui o nosso voto de esperança. Se a gente conseguir aprender um pouquinho a cada dia, quem sabe todo mundo não entra nessa onda de amor e aceitação também? Espero que, no futuro, a minha filha, ao contrário de mim, cresça sabendo que é perfeitamente normal ela gostar de azul e seu amigo ter um material escolar de flores.

Lutemos por um mundo de escolhas livres.