Havia alguém aqui que costumava rir de qualquer bobeira que aparecia pela frente. Alguém que não se importava, que sonhava e flutuava lá em cima, junto com as nuvens, enquanto fechava os olhos para sonhar.
Havia.
Agora não há mais.
Os sorrisos simplesmente apareciam, sem maiores preocupações. Não importava o que tinha acontecido no segundo anterior, nem mesmo o que estava por vir. Era tudo tão fácil que, mesmo se as coisas dessem um jeito de entortar o caminho e partir para a confusão, eu logo tratava de voltar a ver o mundo com aquelas lentes coloridas especiais.
A minha leveza era genuína e, como uma pena, eu passava por tudo com paciência, constância e agilidade. Tudo tinha seu ponto bom. Tudo era um sorriso certo.
E eu costumava ser feliz saboreando cada pequena parte do meu dia, mesmo que não houvesse nada de novo nele. Tinha algo aqui dentro que era muito simples e bonito: a bondade me conduzia e me deixava em um modo permanentemente tranquilo. Talvez fosse um misto de paciência e um otimismo muito grandes que me guiavam, dando as mãos e enquanto eu olhava sempre para a frente.
Foi então que, em algum momento do percurso, tropecei.
Não era o primeiro, mas certamente foi o impacto mais dolorido que eu havia sentido. Aquilo tudo que vivia aqui se provou frágil como vidro – me dei conta disso quando vi os caquinhos espalhados pelo chão.
Não perdi todo o sentimento bom, pois, de fato, me ergui e continuei caminhando. Mas não dava para ignorar que algo tinha ficado lá atrás – a minha realidade já não era mais a superfície cheia de cores que eu havia pintado.
Hoje, quando olho para o espelho, vejo que não sou mais a mesma. Comecei a ver a parte difícil de cada situação e os sorrisos já não saem mais tão despretensiosamente. Leva um tempo para a alma rir. Leva um tempo para a felicidade brotar.
E vou me adaptando a esta nova realidade, que já não é o mar de rosas que costumava ser. Tento trazer as cores de volta, nem que seja em outras interpretações, para fazer ressoar tudo o que é bom.
Talvez seja permanente, talvez seja uma fase. Fato é que, embora seja difícil, sei que, hoje, o que tenho é somente a realidade (e não adianta nada fingir ou tentar negar).
É com ela que preciso me acostumar – para, aos pouquinhos, me recuperar.