Estava arrumando a minha escrivaninha quando comecei a ouvir vozes. Calma, não há o que temer: este não é nenhum texto de terror e não vou falar sobre fantasmas de lençol branco por aqui.
Fato é que, em meio à distração, as vozes começaram. Não sei por qual motivo – e duvido que o simples fato de separar canetas coloridas no porta-lápis tenha desencadeado isso -, mas elas simplesmente desataram a falar em minha cabeça, cada vez mais.
Meio doido, meio mágico.
Foi de repente e, quanto mais elas falavam, mais alguma coisa ia crescendo aqui dentro. Comecei a sentir um entusiasmo que não me visitava há um certo tempo e aquela típica sensação de ansiedade, de quem aguarda muito por algum evento, se instalou sem maiores avisos.
Me deu vontade de dançar e, bem, foi justamente o que fiz. Em frente ao espelho, despreocupada, como se acabasse de receber uma boa notícia – mesmo não tendo falado com ninguém. E, bom, pensando por este lado, desta vez eu realmente não falei – só ouvi.
Também parei um pouco em frente ao espelho e curti o que vi. Antes, estava preocupada com a oleosidade da minha pele, com a textura do meu cabelo e com o tamanho do meu nariz. Agora, tudo isso se mostrava incrivelmente pequeno. Não tinha me dado conta de minha verdadeira beleza. Me deu vontade de abraçar a mim mesma e pedir desculpas por todas as coisas ruins que já pensei a respeito de cada detalhe do meu corpo (e também da alma).
Me senti importante. Não como quem é lembrada por outro alguém quando recebe uma ligação com palavras de carinho no meio da madrugada – eu não precisava mais deste tipo de acontecimento para atribuir valor a mim mesma. Porque, afinal, eu tenho de fato uma porção de coisas lindas por dentro e por fora!
E as vozes continuavam, me transbordando como se eu fosse, antes, um copo vazio. Quanto mais palavras elas derrubavam em mim, mais me enchiam de ideias positivas.
Me diziam que eu estava no caminho certo – mesmo que antes eu nem soubesse qual era este caminho. Me diziam que eu tinha motivos de sobra para me vestir com um sorriso no rosto – ainda que coisas não tão boas tenham acontecido na semana passada. Me falavam, sobretudo, palavras que fortaleciam e davam coragem. E eu nunca fui do tipo que junta forças para espantar nem a barata lá da sala…
Mas isso importava? Não! Parecia uma louca, mas eu ri, e muito… Aquilo ali era melhor do que conselhos de amigos próximos, era mais eficaz do que as coisas que eu havia lido e foi mais importante do que tudo o que já tentei fazer para me convencer daquela verdade.
A diferença foi que, finalmente, reparei que era tudo real. Irônico, né? Bastaram as vozes falando e falando em minha cabeça, dizendo tudo o que eu precisava ouvir.
Ventos? Imaginação? Uma palestra de motivação tocando em algum rádio antigo, lá no fundo? Um telefone esquecido em ligação?
Nada disso.
As vozes eram minhas.
E desta vez eu falava bem alto – para ficar para sempre gravado na memória o efeito que minha opinião e a vontade de ver as coisas dando certo pode ter sobre a vida. E não é que tiveram?
O dia seguinte foi incrivelmente normal – nada de novo aconteceu. Mas foi muito mais especial do que os anteriores. Pode ter certeza.