Hoje o post é especial! Muitas leitoras nos procuram e compartilham com a gente vários de seus textos incríveis. Tem histórias de amor, pensamentos aleatórios, crônicas cheias de conselhos e, algumas vezes, chegam até nós relatos bonitos como o da Débora Miranda, estudante carioca de Letras e Direito, que nos escreveu pedindo para falar no blog sobre a vida de mulheres negras. Ficamos felizes demais com a iniciativa. O texto é claro, sincero e muito relevante. Você vai gostar. Vamos lá?
“O título deste texto parece bem simples e objetivo. Afinal, na nossa realidade, não é tão difícil entender que ser mulher é bastante complicado – e que ser negro ou negra vai pelo mesmo caminho. Em contrapartida, escrever sobre isso com total certeza é mais complexo do que parece. Colocar em um papel tudo o que mulheres negras passam é árduo, delicado e particularmente me afeta de uma forma bastante pessoal. Mas vamos ao que interessa.
Ser mulher é viver em uma luta constante: para ter sua voz ouvida, um tratamento igualitário, para não ser mais uma vítima da violência que cisma em perseguir o público feminino… Ser mulher é algo muito mais complexo do que se pensa. Dizer que somos o “sexo frágil” deveria ser completamente proibido! Quem sofre o que sofremos – ou quem passa pelo que passamos – não tem nada de frágil. Ser mulher é ser forte, é ter de enfrentar um mundo que não foi moldado para nós, é duelar com um universo machista e conservador para conseguir ser ouvida. Agora, se ser mulher por si só já é algo difícil, imagine ser uma mulher negra?
Infelizmente eu não posso escrever que ser negra é igual a ser branca, parda ou o que seja. Essa diferença “pequena”, o tom de pele, influencia muito no modo como se é tratado em sociedade. Logo, somando estas variáveis – o sexo feminino e o tom de pele negro – fica claro perceber que ser uma mulher negra demanda muitos esforços.
Algo que é notório para exemplificar é o fato de que, muitas das vezes, as características físicas das negras são tidas como ruins, como o nariz grande, o “cabelo ruim”, a boca grande, etc. Em nossa cultura, há um enaltecimento absurdo de pessoas brancas, o que, isoladamente, não é um problema. A questão é que pessoas negras não são enaltecidas da mesma forma.
‘Você não sabe sambar?’ ‘Se eu fosse você, alisava esse cabelo. Mas já que você não quer, porque não tira o volume?’ Essas são algumas frases que muitas mulheres negras estão acostumadas a escutar durante a vida. Estereótipos enraizados que vêm desde a época da escravidão e ainda são carregados hoje em dia.
O problema que toda e qualquer mulher negra enfrenta é a aceitação. Quisera eu poder dizer que é apenas a aceitação dos outros, porém falo de algo bem mais difícil e frágil, a autoaceitação. A pior guerra que podemos ter é com nós mesmos e, antes mesmo de lutar contra o mundo, temos que travar uma batalha pessoal, interna. Temos que nos olhar no espelho e admirar o que vemos. Quebrar paradigmas e negar tudo o que a mídia, os amigos e até mesmo os familiares venham a dizer e aconselhar. Vai por mim, por experiência própria: não é fácil. E então buscamos referências, apoio em grupos de redes sociais e em pessoas que gostam de nós como somos.
A segunda aceitação, a social, não é tão complexa, mas bastante importante. Não é motivador ter que lidar com a difícil tarefa de levantar, vestir uma roupa e pelo menos uma vez ao dia ter que encarar o preconceito. Além de superar a barreira do machismo de nossa sociedade, também temos que lidar com a barreira do racismo. Vale salientar que este último mecanismo – o preconceito racial – se rebuscou demais. Ele, atualmente, não é tão simples de ser notado: está mascarado em atitudes sutis ou até mesmo bem complexas. Talvez você não saiba, mas a luta por autoafirmação da mulher negra é tão forte que o dia 25 de julho é considerado o Dia internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha.
Ser mulher negra é muito, muito complicado. Às vezes posso até dizer que até dói. Mas acredito que estamos caminhando, mesmo que a passos ainda curtos, para melhorarmos esta situação e para que, finalmente, possamos ser respeitadas.”
A Débora é estudante de Direito da Fundação Getulio Vargas, estudante de Letras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, membro do Coletivo Negrx da Fundação Getulio Vargas, membro da FGValley e co-diretora do eixo Promoção de Igualdade do Observatório Internacional da Juventude. As fotos ao longo do post são dela em seu dia a dia na faculdade. :)
Obrigada por escolher o nosso espaço, Dé. A gente espera que este texto tenha tocado vocês assim como nos tocou. Diz o que achou nos comentários? Beijos!