Foi a capa de janeiro da revista Marie Claire que abriu as portas para um diálogo que cresceu bastante nos últimos dias. Nela, a inspiradora atriz Bruna Linzmeyer comemora a liberdade e, com os braços abertos, coloca para jogo os seus pelinhos. Sim, viemos falar sobre pelos, aqueles que nós, vocês, todas temos. E foi aí que muita gente começou a falar: algumas mulheres repensaram padrões, outras entenderam que, sim, esta é mais uma regra imposta a nós e, infelizmente, também teve muita gente julgando e até xingando. O assunto rendeu tanto pano pra manga que Bruna veio falar disso mais uma vez e postou esta foto, que abre o nosso post:
Foto: Reprodução/Instagram
Na legenda, a atriz conta que a obrigação de se depilar foi se desenvolvendo como uma construção da sociedade e que, portanto, cada mulher pode fazer o que tem vontade com seu corpo. Perguntando-se sobre o que ela realmente queria e o que gostava, Bruna um dia resolveu experimentar tê-los e vê-los: os pelos, então, cresceram em seu corpo sem serem raspados ou cortados pela raiz. E foi aí que sua mentalidade mudou:
“Aprendi que liberdade e amor é respeitar a escolha das outras pessoas, quando essas escolhas não violentam ninguém. E poder acessar meu coração e responder sem amarras: o que eu quero? O que eu gosto? De que jeito me sinto bem?”
Somos só aplausos por aqui! Pois bem: ficamos com vontade de saber mais, ouvir mais e conversar sobre isso, justamente porque crescemos vendo a depilação como obrigação e agora estamos passando pelo processo de perceber que é apenas mais uma imposição feita às mulheres. Entre tantas, é só mais uma. E, aqui, a gente te mostra um pouquinho desse lado B: jogamos o tema no nosso grupo do Facebook e encontramos a Débora, a Gabrielle, a Giulianna, a Bharbara e a Raianny. Elas falaram sobre suas próprias experiências de coração aberto e mostraram como deixaram a remoção de pelos fora de suas vidas.
DE ONDE PARTIU A DECISÃO?
Débora: “Sempre morri de preguiça de fazer depilação, mas como minha mãe falava muito disso, eu fazia, religiosamente, toda semana. Com 17 anos descobri que tinha SOP (Síndrome do Ovário Policístico), o que ajuda a ter mais pelo. Eu depilava com cera ou depilador elétrico e poucos dias depois já estavam nascendo de novo. Quando fiz 19 anos, terminei um namoro abusivo que me abriu portas para o feminismo. Fui entendendo que as coisas que aconteceram no relacionamento não era minha culpa e percebi que eu poderia parar de seguir o que os outros queriam e fazer as minhas vontades. Li blogs, entrei em grupos e comecei a enxergar a depilação como um dos padrões estéticos que a sociedade nos impõe. Larguei progressiva, larguei gente tóxica e larguei a depilação, tudo de uma só vez. Juntou o fato de eu não gostar de me depilar, um pouco de preguiça e eu não ligar para os pelos com o feminismo me mostrando que depilação era opcional, e não uma obrigação.”
Raianny: “Eu era muito preocupada com a minha estética. Me sentia na obrigação de performar uma feminilidade ao extremo, porque achava que assim chamaria a atenção dos homens. Só que isso custava muito da minha autoestima. Não percebia conscientemente o que estava fazendo, era automático, eu só fazia. Lembro de uma vez que estava ficando com um cara e tinha esquecido de me depilar. Fiquei toda preocupada, “ai meu Deus, o que ele vai pensar?”, e no fim ele nem ligou – ainda elogiou meus pelos e começamos a conversar sobre isso. Percebi que só me depilava quando me relacionava com algum cara. Foi a partir disso que decidi parar de me depilar.”
NÃO É UMA QUESTÃO DE HIGIENE
Giulianna: “Há quatro anos, por recomendação da minha dermatologista, fiquei alguns meses sem depilar as axilas. Comecei a perceber que meus pelos não me incomodavam tanto. Vi que, na verdade, não era algo relacionado com a minha higiene (e olha, sou bem chata neste quesito!), mas sim um padrão estético imposto pela sociedade. A ideia de que toda vez que me depilo gero uma agressão constante na minha pele (pois os pelos nascem por um motivo no nosso corpo, para proteger determinada região) e a sensação de falta de necessidade de fazer isso me fizeram questionar: ‘preciso mesmo perder meu tempo, dinheiro e sentir uma dor chata só para tirar pelos que vão continuar crescendo ali pra sempre?’. A minha resposta foi um simples “não.” Agora só me depilo quando realmente quero e sinto vontade. Libertar-se de imposições é maravilhoso e te faz MUITO bem, mental e fisicamente.”
A NOSSA HISTÓRIA COM PELOS É ANTIGA
Bhárbara: “Sempre sofri muito com depilação, sou peluda e desde cedo tive essa cobrança de tirá-los, principalmente na escola, onde eu sofria bullying. Além disso, tenho alergia a lâminas e alguns componentes de cremes depilatórios, então sempre precisei depilar na cera, o que é muito doloroso. Achava isso contraditório, apesar de estar impregnado na minha cabeça que pelos eram feios e nojentos – muitas amigas falavam sobre deixar a pele lisinha para o namorado e coisas do tipo. E eu só pensava: ‘Mas não tenho que querer estar assim por mim?’. Em 2017, comecei a transição capilar e o processo de aceitação de quem sou e, em 2018, decidi aceitar mais os meus pelos. Não foi fácil e gera tanto olhares quanto piadinhas da família, que não entende. Mas a internet é incrível e te mostra mulheres que também passam por isso, acho até que essa parte é fundamental: ter com quem se identificar nos deixa mais fortes na nossa decisão. Agora, depois de um ano, entendo que depilação deve ser feita quando nós quisermos. E não existe isso de ser “por higiene”, temos pelos para proteção e eles são da nossa natureza.”
A ACEITAÇÃO É UM PROCESSO
Débora: “Apesar de o feminismo abrir meus os olhos para o fato de que depilação é totalmente opcional, eu estava muito acostumada a achar nojento e feio. Eu queria parar de fazer, mas ao mesmo tempo não conseguia. Cheguei até a me sentir uma falsa feminista, já que seguia padrões. Mas, com o tempo, percebi que feminismo era liberdade! A aceitação levou tempo, teve muita reflexão, não foi só deixar de fazer depilação. Passei por um processo de autoconhecimento e da aceitação do meu verdadeiro eu, sem influências externas.”
COMO LIDAR COM O OLHAR DO OUTRO?
Bhárbara: “Às vezes me pego desconfortável com alguns olhares e lembro que isso é normal, porque todo mundo é ensinado a não gostar dos pelos femininos. Para isso, temos que colocar dentro de nós mesmas o nosso propósito e pensar que pelos não são nojentos, higiene pode ter a ver com banhos, não com pelos. Quando acontece comigo, penso: “Estou limpinha? Sim. Estou cheirando mal? Não. Esses olhares vão mudar o meu sentimento de liberdade? Não!” E aí sigo a vida! É muito difícil, mas tem que ser como um mantra. O meu corpo é meu e de mais ninguém.”
Giulianna: “Sempre penso que não estou sozinha nesta decisão, existem muitas garotas como eu por aí. Por isso, acho muito importante ter esses ambientes de debate saudável, como a postagem no grupo do DDQ, em que você encontra pessoas com a mesma linha de pensamento e que não te julgam. Lembro que, quando tomei a decisão, procurei blogs com matérias ou relatos e não achei nenhum, assim como mais pessoas abertas a falarem disso. Somos lindas, livres e donas do nosso corpo. Se é algo que te faz bem, persista! No final do dia, o que vale é o que você sente e, o mais importante, estar feliz consigo mesma.”
Raianny: “Logo quando eu parei, minha mãe caiu em cima enchendo o saco e reclamando que eu queria ser um homem. No começo foi difícil ouvir os comentários dela, mas as meninas ao meu redor me deram motivação para continuar. Meus amigos nunca reclamaram ou fizeram piadas, já no transporte público é uma coisa que até hoje às vezes acontece: quando preciso levantar o braço para segurar na barra, sempre tem quem fique olhando, e isso é um saco. Por vezes eu deixo de levantar os braços, já cheguei a quase cair no metrô por conta disso, simplesmente porque estava com vergonha. Aí penso que sempre vai existir gente que vai achar feio. Pode ser a coisa mais linda do mundo, a roupa mais maravilhosa, o cabelo mais incrível, sempre vai existir uma pessoa que não vai gostar e eu vou ter que aprender a lidar com isso. A gente gostando e achando bonito, está ótimo.”
Débora: “O maior problema realmente são as pessoas, nós ainda nos importamos muito com o que os outros falam. Tem gente que olha e faz cara de nojo. O que mais me incomodou foi quando engravidei: foi um processo complicado e passei semanas internada, tive um parto prematuro, não deixaram nem meu namorado entrar na sala pois não sabiam o estado da minha filha e, na hora da cesárea, depois da anestesia e dos remédios, um dos médicos fez comentários com a enfermeira sobre a minha depilação, como se eu não tivesse lá. Fiquei muito chocada na hora e nem tive reação.”
SOBRE AS OPÇÕES
Gabrielle: “No geral, eu queria que principalmente as mulheres vissem isso como uma escolha como qualquer outra. Não te faz menos ‘mulher’ ou menos ‘feminina’, como muita gente acha. Depilar-se não deve ser ceder à pressão da sociedade: tem gente que não suporta ter pelos, assim como eu não quero não tê-los, e as duas opções podem conviver lado a lado.”
Chegar mais perto dessas histórias foi inspirador pra gente. Vendo assim, de pertinho, percebemos ainda mais o quanto tudo isso é simples. No máximo é diferente do que você, aí do outro lado da tela, faz hoje. Assim como algumas garotas podem desejar ter cabelos curtos ou tingidos e, outras, longos e na cor natural. E se um dia você resolver mudar de ideia também, vá fundo. Faça o que o seu coração e todo o resto do seu corpo mandarem.
Agradecemos infinito todas as meninas que participaram deste post. <3
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