você está lendo Escrever: modo de usar

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Então você decidiu que quer ser escritora. Decidiu que é a coisa que você mais quer na vida. Esse momento é meio mágico, né? Saber o que quer fazer da vida.

E agora, como escrever? Há um método? Existem regras? Como faço? Como começo? Essa é, pra mim, uma das coisas mais legais sobre escrever: não há regras. Cada um cria seu método, o que funciona para alguns pode não funcionar para outros. O que funciona bem pra mim pode ser a ruína pra você. Eu, por exemplo, não tenho método. Meu método é esse: não ter método. Qualquer outro método é um fracasso pra mim. Vou anotando e escrevendo quando as ideias vêm, é um processo bem caótico mesmo, e sempre funcionou, desde o primeiro livro. Primeiro vem uma inquietação, aí eu penso um pouco sobre uma situação, geralmente algo que está me incomodando, e de repente as palavras começam a vir, assim mesmo, como se estivessem jorrando de algum lugar no meu cérebro que eu não sei bem onde é. Fiquei muito feliz quando descobri que minha escritora favorita, a Carmen da Silva, também funcionava mais ou menos desse jeito. Em sua autobiografia “Histórias híbridas de uma senhora de respeito”, um livro maravilhoso lançado pela editora Brasiliense nos anos 80 e que infelizmente é muito difícil de achar, ela conta:

*
Poucos meses mais tarde, acordei-me um sábado de manhã, com uma luxuosa jornada livre pela frente, vesti um peignoir, tomei um café, bobeei um pouco pelo quarto, querendo algo que eu não sabia bem o que era. Até que dei com um bloco de papel vagabundo para anotações, um lápis. E comecei: “Haria falta un sereno, el movimiento no cesa en toda la noche.”

Que noite, que “sereno”? Que lugar era esse onde fazia falta um guarda noturno? De onde eu havia tirado – ou melhor, estava tirando – essa pensão de categoria tão ínfima que eu jamais conhecera de perto nada semelhante, que gente era essa que a habitava e não ficava quieta a noite inteira?
O lápis sabia, os dedos sabiam.

Cinco horas da tarde e eu, ainda de peignoir, continuava escrevendo feito uma alucinada, às oito vesti uma roupa e desci para engolir algum alimento, umas “castanhas e piranhas”nos Astro’s Club, levando comigo o bloco.

Após algumas semanas frenéticas, em que fazia mal e mal meu trabalho do escritório, desatenta como um zumbi e logo corria à casa para ressuscitar ante o texto, escrevi a palavra “Fim”e fiquei ali toda trêmula, trepidante numa exaltação misturada com angústia, susto, cansaço, sensação de irrealidade: tinha acabado de escrever “uma coisa” que parecia um romance.

*

É uma coisa doida isso dos escritores saberem exatamente como você se sente. Especialmente quando você também é uma escritora, aí a coisa fica ainda mais incrível.

E cada um tem seu processo. Algumas pessoas só conseguem criar diante do absoluto silêncio. Outras já não se importam tanto com isso, ou não conseguem ter o absoluto silêncio e têm que se virar pra fazer como dá, senão não fazem nunca. Algumas pessoas escrevem de manhã, outras à noite, outras em casa, outras na rua.

Anote. Anote tudo, anote onde estiver, anote todas as ideias, mesmo que pareçam idiotas. Pode ser que de uma ideia aparentemente idiota venha uma outra grande ideia e que dessa nova ideia saia um texto, um conto, um romance. E cuidado com as distrações, especialmente com a internet. Não há linha de raciocínio que resista àquela olhadinha no facebook, aquela checadinha de email. Fuja disso. Feche o email, feche o facebook, programe-se para se concentrar naquilo que quer fazer, ou boas ideias escorrerão pelo ralo da internet abaixo.

O mais importante é: encontre seu próprio método.

E como você pode fazer pra encontrar o próprio método?
Ora, você tem que tentar.
Quando você encontrar, vai saber.

O livro “How Great Minds Make Time, Find Inspiration, And Get To Work” (Como grandes mentes arrumam tempo, encontram inspiração e trabalham, ainda não lançado no Brasil) conta os rituais de 161 escritores e o site Homo Literatus fez uma lista com 10 deles. Muitos viveram há muito tempo e os hábitos eram outros, mas pode ser um exercício divertido tentar imaginar como seria nos dias de hoje. Não é tão diferente, né? Escrever é escrever. Corre lá e vê se consegue se identificar com algum!