Nunca fiquei tanto tempo preso, tanto tempo sem sentir o calor do sol. Ainda me lembro das épocas de verão: por aqui as coisas eram mais coloridas, quentes e com borboletas brancas. Tão lindas. Ela não gostava muito das borboletas, mas eu as adorava. Até que, um dia, depois que anoiteceu, o sol nunca mais voltou.
Eu sabia que alguém tinha a feito chorar – eu conseguia sentir, porque estava começando a ficar com alguns hematomas pelo corpo.
Era chegada a hora de ficar doente e de cama.
Minha febre passou uns meses depois e as cicatrizes começaram a se formar, mas até agora o sol não voltou. Desde aquele fatídico dia, nós dois conversamos sobre as coisas, sobre as pessoas, sobre a vida. E posso te contar o que descobri?
Ela tem não medo de viver – talvez algum receio de arriscar, mas de viver? Jamais. Sua risada não é harmoniosa, mas é sincera e contagiante. Às vezes você vai cansar de ver o seu sorriso, mas nunca se cansará dela.
Ela sempre vai achar que seu cabelo está pouco volumoso (não sei ao certo o que isso significa).
Ela tem apenas uma covinha, sabia?
Seus olhos no sol são cor de chocolate – e ninguém nunca percebeu isso.
Ela não gosta de falar sobre os próprios problemas, porque prefere ouvir os dos outros (não por curiosidade, mas para ajudar – preciso confessar que isso me irrita às vezes). Acho que ela é a melhor pessoa pra se confiar um segredo, chega a ser melhor do que o Gringotes. É viciada em livros, conversas longas e piadas sem graças. Ela ainda não aprendeu a receber elogios, mas está treinando dizer “obrigada” sem ficar vermelha.
Prefere dar presentes do que receber. Se você chegar a ver uma lágrima caindo de seus olhos, é porque ela não suporta mais a dor e a única coisa da qual precisa é um abraço silencioso que diga “pode chorar sem culpa”. Ela ainda acha que lágrimas são um sinal de fraqueza, por isso raramente chora.
Ela ama abraços cheirosos. Massagens de graça.
E tem vontade de ter um beijo roubado.
Pode parecer muita coisa, mas ela tem ainda mais a mostrar. Para o mundo, para você e para si mesma. Já escutei alguém chamando-a de “misteriosa”, não sei o que isso quer dizer. Você me conta se descobrir?
Sei que ela sente vontade de dizer (talvez gritar) algumas coisas, mas daqui não posso fazer muito. Talvez segurar um pouco a barra até quando alguém que realmente queira ouvi-la aparecer.
Não nos conhecemos, mas posso te pedir um favor? Se você realmente quiser escutar o que ela tem a dizer, comece fazendo uma piada sem graça. Se ela sorrir, provavelmente o tempo aqui dentro voltará a clarear e eu finalmente sentirei calor novamente. E, se dermos sorte, talvez as borboletas voltem.
Obrigado.
Assinado: o coração dela.
Por Lara Cristini, 21 anos, Brasília (DF).
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